domingo, 31 de maio de 2009

Passe adiante

O dia amanheceu cinzento e prenunciava fortes tormentas. Era um dia daqueles em que tudo que menos se quer é deixar o conforto da cama quente e da segurança do lar. Mas a vida lhe chamava lá fora e Sofia tinha que cumprir sua jornada diária. Assim como o cinza do céu estava seu começo de dia. Ao sair da garagem de seu prédio, apressada como de costume, encostou o carro no portão. Nublou-se, mas seguiu. Estacionou o carro próximo ao trabalho e percebeu que havia esquecido seu guarda-chuva. Foi então que surgiu um desconhecido que lhe ofereceu carona no seu guarda-chuva azul. Acostumada com a violência da cidade grande, Sofia ficou surpresa com a gentileza daquele homem e recusou seu auxílio, afinal, poderia ser mais um golpe de um bandido que a assaltaria mais adiante. Mas, a chuva estava tão forte que se imbuiu de coragem e aceitou a gentileza. Caminhou com aquele desconhecido até chegar ao trabalho, durante uns três minutos. Sentiu remorso por ter duvidado dele. Um remorso tão intenso que a fez encolher-se em si mesma, mas no fundo estava feliz por sentir calor humano naquele dia tão acinzentado. Despediu-se dele com um Obrigada. O senhor foi muito gentil. A resposta que obteve, ficou guardada em sua memória: Não há de quê. Passe adiante. Dias cinzentos podem se tornar azuis. Você que está lendo esta historieta, passe adiante. Gentilezas sempre são bem-vindas, principalmente quando não são esperadas.

Ausência


Saia de casa antes de clarear o dia. Dirigia cerca de duas horas até chegar ao trabalho. Era o primeiro a chegar e o último a sair. Passava o dia inteiro em frente ao computador, cercado de planilhas e e-mails. Sempre gentil com todos, inclusive com aqueles a quem jamais convidaria para ir a sua casa. Ossos do ofício. Passava o dia inteiro ao lado de vários colegas e pouco sabia de suas vidas. Tampouco ele sabia da vida deles. Estavam quites. Muitas vezes, laconicamente, dizia apenas um bom dia e nem sempre encontrava resposta. Em um inverno, afastou-se do trabalho porque seu pai havia falecido. Ao retornar, nenhum colega confortou-lhe pela perda. Alguns nem sabiam o que havia ocorrido. Encontrou em sua mesa uma pilha de envelopes que o levariam à produção de novas planilhas. Certo dia, durante o expediente, sofreu uma parada cardíaca. Sua cabeça pendeu sobre a mesa na qual trabalhava. Seus colegas só notaram sua ausência três dias depois, quando a natureza começou a sinalizar que aquele corpo não pertencia mais a esta vida.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Nada a perder

Não tenho nada a perder. Na falta de melhores palavras para definir o sentimento de incerteza que lhe invadia os pensamentos, foi isso que disse. Estava ali por prazer, apenas isso. Não basta?

domingo, 24 de maio de 2009

Vendedor de palavras

Apareceu de repente. Tinha cheiro de incenso e tatuagens no corpo. Queria vender suas poesias. Se verdade ou mentira o que ele me falou, acolhi seu trabalho de vendedor de palavras. A poesia que escolhi em nada me interessava. Era tola demais na minha concepção, mas falava de amor. Amor à primeira vista. Segundo ele, a mais vendida. Antes de sair, ele me disse que não acreditava no que havia escrito e que aquela poesia era mera ilusão. São palavras ao vento – disse ele. Eu não acredito no amor – acrescentou. Paguei 1 real. Agradeceu, apertou minha mão e disse: Talvez não valesse 1 centavo, mas o melhor que ganhei hoje foi o seu sorriso.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Fascinação

Guardo uma frustração de infância por nunca ter tido um kit detetive. Costumava ver o anúncio desse kit nas revistas em quadrinho da Turma da Mônica. Nunca tive o prazer de ganhar um de presente. Não faço a menor ideia se ainda existe esse tipo de anúncio em revistinhas. Não é algo que a meu ver faça sucesso entre as crianças de hoje, talvez nem fizesse entre as da minha infância. Já me diverti bastante com o jogo Interpol. Fascínio absoluto. O estímulo que sinto de investigar as coisas me arrebata. Há um desejo latente em mim de desvendar mistérios. Não entendo bem que fascínio intenso é esse que me empurra a fazer descobertas. A satisfação que tenho é indescritível. Doce deleite da minha alma.

(Imagem: Flickr)

sábado, 16 de maio de 2009

Sonhos


É incrível ver o brilho nos olhos de alguém quando fala de um sonho, porém ainda mais incrível é sentir esse brilho em si mesmo. Tudo pulsa, tudo vibra, tudo brilha!

Pizza com Coca-Cola

Manhã:

Vai sair?

Vou.

Os chinelos andavam por toda a casa, vagarosamente. Afastava o cachorro, recolhia um cisco do chão, olhava através da janela. Penteava os cabelos. Percebia movimentos no quarto e de novo perguntava:

Vai sair?

Vou.

Você só anda na rua. Não demore.

Sentava-se no seu sofá cativo, pegava a caixinha de costura, alguns tecidos e começava a costurar. Levantava, ia para o quarto, cochilava e aguardava o horário do almoço.

Almoço:

O almoço era colocado no prato e anunciado. Sempre dizia que não estava com fome, mas sentava-se no mesmo cantinho da mesa e comia sem reclamar. De volta ao sofá, assistia um pouco a algum programa na TV, afastava o cachorro, bebia um pouco de suco, olhava pela janela, cochilava e esperava o sol se pôr.

Noite:

Tomava banho, vestia o robe, passava talco, penteava os cabelos e esperava o café. Ouvia o barulho da chave na porta, os latidos eufóricos do cachorro e dizia:

Que demora danada!

Eu tenho que trabalhar...

Que diabo de trabalho! Bote logo meu café que eu quero ir dormir.

Sentava-se à mesa, tomava café, dava uns pedacinhos de pão ao cachorro, tirava a dentadura, guardava em um copo e ia dormir. Costumava sonhar que estava comendo um pedaço de pizza com Coca-Cola.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

13 de maio

“O 13 de Maio tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana.” (Monteiro Lobato, no conto Negrinha)

Dia da abolição da escravatura ou dia do começo das violências veladas?

Que Deus permita um dia que o mundo se dispa de toda e qualquer forma de racismo. Que a humanidade se permita uma junção de cores e construa uma bela aquarela, com respeito às crenças, costumes e valores.

domingo, 10 de maio de 2009

Destino

Hoje, faz exatamente 6 anos que me formei. Que rumos tomei de lá para cá? Consegui realizar tudo que havia projetado naquela época? Não e sim. Sim e não. Talvez...

Coincidência do destino ou não, encontrei ontem em um restaurante o garçom que contratei para trabalhar na minha festa de formatura. Incrivelmente, aquele homem não só me reconheceu, como sabia o meu nome. Fiquei estupefata! Meu namorado, que presenciou a cena, chegou a pensar que o pobre garçom queria ouvir nossa conversa, pois não tirava os olhos da mesa em que estávamos e não perdia a oportunidade de se aproximar. Não nego que por um momento cheguei a pensar que conhecia aquela figura, mas foi um pensamento vago e que logo foi desfeito. Grata foi minha surpresa na saída daquele restaurante, quando sem resistir à descoberta, ele revelou que me conhecia. Josué garçom. Era assim que tinha seu nome registrado em meu celular antigo. Perdi o contato depois. A riqueza de detalhes que aquele garçom revelou saber da noite de minha formatura me deixou realmente impressionada. Só errou na cor do meu vestido. Mas saber meu nome foi demais.

Esse encontro me fez refletir um pouco sobre o que se passou comigo durante esses seis anos. Mudei de namorado (esse é para casar, meu Deus!). Nunca imaginei que fosse dirigir e hoje dirijo, não sou uma hábil motorista, mas enfrento a pista aos trancos e barrancos. Pensava que já teria minha casa (em breve, people...). Trabalho em um lugar no qual sequer imaginava na época. Voltei para a faculdade por amor à Literatura. Quem diria... Pinto minhas unhas de vermelho vibrante, aliás, pinto de quase todas as cores, coisa que jamais fazia antes. Ai, ai...

E vocês, que passeiam por meu jardim, já pensaram no que se passou em suas vidas nos últimos anos?
(Imagem: Google)

Nada

Todos os dias, inúmeras pessoas que circulavam na rua Esperança viam um homem deitado na calçada. Às vezes, nem o viam, pois se enrolava em sacos e papelões e facilmente era confundido com pacotes de lixo. Quando não estava deitado, aparecia do outro lado da rua jogando uma pedrinha para cima e pulando em volta de si. Foi assim por muito tempo, anos a fio. Ele não pedia nada, não falava nada, não olhava para ninguém (ou se olhava, ninguém percebia). Como ficava boa parte do tempo deitado no chão, sua distração era apreciar os sapatos que por pouco não chutavam seu corpo estendido na calçada. Alguns transeuntes que passavam pelo local, chegavam a pensar em como aquele homem atrapalhava a passagem, inclusive, comentavam entre si a inconveniência. O dono de uma padaria próxima à morada daquele indivíduo alimentava-o com uma refeição ao dia.

Certa noite, uma ronda policial levou o sujeito embora porque estava nu. Nunca mais foi visto. Muitos sequer notaram sua ausência. O local onde ficava o sujeito logo foi ocupado por um cachorro. Graciosíssimo. Em poucos dias, uma senhora, que passava por ali regularmente, apiedou-se do cãozinho e o levou para casa, onde foi recebido com muita alegria por sua família.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Viajar é preciso


"Viajar é viver". Desbravar lugares novos. Conhecer outras pessoas. Passar uns dias fora do seu lugar comum. Degustar novos sabores. Registrar nas lentes da câmera fotográfica (essa invenção maravilhosa), na memória e no coração momentos inesquecíveis.

Quem dera...

Quem dera a chuva servisse apenas para aproximar casais em um abraço e um beijo caloroso, dividindo um pequeno espaço de proteção embaixo de um guarda-chuva. Quem dera essa mesma chuva servisse apenas para acolher o corpo de quem se ama embaixo do cobertor. Um resguardando o outro em seu ninho. Quem dera a chuva servisse apenas para irrigar a vida de mais vida. Quem dera a chuva fosse mais motivo de alegria do que de caos. Quem dera...
Oh! chuva
Eu peço que caia devagar
Só molhe esse povo de alegria
Para nunca mais chorar.

(Trecho em itálico - Composiçao: Luís Carlinhos / Intérprete: Falamansa)
(Imagem: Google)

domingo, 3 de maio de 2009

Acalanto

Escrever é uma arte que existe para acalantar o coração e as ideias.

O retorno de Saturno

28 anos, quase 29, batendo à porta dos 30. Descobri recentemente em conversa com uma colega de trabalho que para os astrólogos, nesse período da vida, vivemos o retorno de Saturno. Encontrei um texto interessante sobre o assunto. Colei abaixo para quem se interessar:

Entre os 28 e 30 anos de idade, ocorre o primeiro retorno de Saturno, ou seja, o planeta em trânsito se posicionará no mesmo local em que ele estava no momento de nascimento da pessoa e iniciará uma nova volta em torno do zodíaco.

Novamente, como em todo trânsito de Saturno, ocorre um doloroso rito de passagem, envolvendo responsabilidades, desta vez maiores do que nunca. A partir deste período, muitas coisas que antes eram parte de uma gama de opções se tornam definitivas. É o momento de determinar o que vai dar impulso aos próximos 28 anos e tudo o que é decidido tem sua repercussão e conseqüência.

Este período representa também o fechamento sobre todo o passado de dependência familiar, uma liberação final de tudo que ligava às servidões da infância e da adolescência, uma aquisição definitiva de autonomia. É o ponto final do caminho de relaxamento de responsabilidades dos pais sobre os filhos.

Aos 28 anos, as pessoas começam a se preparar para inverter os papéis. Nesta época, surge a necessidade crescente de se fundar um lar, ter filhos, educá-los e progredir profissionalmente. É a chegada definitiva da certeza da sua responsabilidade em relação aos outros, em que se procura gerar confiança em que os cerca e se começa a pensar seriamente no futuro. É o primeiro contato com a sensação de que o tempo passa e que a velhice não tarda a chegar, por isso a intensificação das cobranças internas. Não é mais tempo para ilusões e sim para definições.

Nesta época, as pessoas começam a adquirir um senso de responsabilidade não apenas para si próprias, mas também para aqueles que a cercam. Começa-se a perceber que as suas decisões terão influência na vida daqueles que amam. Agora, e cada vez mais, são os pais que passam a ser seus dependentes, o que aguça o sentido de cumprir sem falhas a sua missão, que é uma tarefa solitária e de extrema importância para toda a família. Mas, ao mesmo tempo, Saturno que é sempre associado a processos de diferenciação, individualização e separatividade, leva os indivíduos a procurarem dar a seus filhos uma educação diferente da que receberam. Paradoxalmente, com a nova aproximação dos pais, as pessoas se deparam tomando decisões surpreendentemente parecidas às deles.

As pessoas que ainda não se definiram na vida passam a se sentir muito angustiadas, porque o fantasma do fracasso começa a ameaçar. Freqüentemente, aos 28 anos as pessoas retomam os estudos, procuram caminhos profissionais definitivos e não mais bicos e trabalhos esporádicos. A crise provocada por Saturno sempre é complicada, já que mexe com assuntos como o tempo e a idade, fracasso, frustração ou sucesso. Todos estes aspectos são muito angustiantes porque abalam a auto estima de cada um.

O ciclo dos 28 anos de Saturno é completado quando se pode tomar nas mãos com segurança as rédeas e o controle da própria existência. Desligar-se do passado para apenas conservar dele as bases mais sólidas sobre as quais deve ser projetado e construído o futuro.

(Trecho da apostila "Ciclos Planetários", da astróloga carioca Márcia Mattos)